Um oásis de horror em meio a uma mesa imposta

Continuação dos textos sobre o medo de não ser quem eu deveria ser. O texto inicial pode ser lido aqui.

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Um dos meus maiores medos é o de ter de me sentar à mesa para comer com algum desconhecido ou algum conhecido que saiba manusear talheres, pratos e guardanapo. Eu acho tudo tão confuso e tão desnecessário! É certo que minhas impressões são extremamente influenciadas pelo fato de eu não ter a menor ideia do que fazer, em questão de organização, diante de um prato, de talheres,  de copo e de guardanapo. Eu não sei de que lado deve ficar o copo. Eu não bebo nada enquanto almoço, mas imagino que o copo deve ficar do lado direito. Sou destra, então não acho que seja muito eficiente ter de cruzar o braço pelo prato para que ele alcance o copo.

A localização do guardanapo na mesa, eu realmente não sei. Acho que já o vi à direita ou à esquerda ou ao sul do prato. A escolha de dizer “sul” vai fazer com que eu comece a chamar direita de leste e esquerda de oeste, o que não ajudará muito. Fico tão desorientada diante de uma mesa posta que tento encontrar maneiras de me nortear, mesmo que geografia física e eu não tenhamos um passado muito feliz. Tenho a terrível mania de reviver passados infelizes até que eles destrocem toda e qualquer possibilidade de eu ter um presente feliz. Tenho a terrível mania de me perder nos detalhes da mesa, o que me impede de ver a chegada do prato principal.

Há alguns dias, uma amiga publicou uma foto do jantar que fez para comemorar o aniversário de namoro. Não lembro o que ela serviu, mas queria lembrar qual foi a disposição dos talheres na mesa. Lembro de ter visto dois pratos, guardanapo – não sei se dobrado em triângulo ou quadrado, não sei se do lado direito ou esquerdo, não sei se com talheres por cima ou não –  duas taças e um vinho que todos disseram ser uma boa escolha. Gosto de vinhos, mas fiquei tão preocupada em entender a disposição dos talheres, que não consegui ver mais nada.

O garfo fica na mão direita, a faca, na esquerda, meus conhecimentos sobre a organização diante de uma mesa se resumem a isso. Mas enquanto a gente leva o garfo à boca, não sei se a faca deve ficar encostada no prato ou na mão, que não sei se deve ficar na mesa ou embaixo dela. Nunca sei onde colocar as mãos, diante de uma mesa posta. Se as mãos não estão ocupadas, cortando a carne, não sei onde elas devem ficar. Não sei onde devo ficar. Talvez eu deva partir. Mas também não sei para onde. Não sei onde colocar os talheres na mesa da qual estou à margem.